14 de outubro de 2022

Trabalhista

Existe subordinação no serviço de entrega por aplicativos?

Matéria LexLatin.

Empresas como Uber, iFood, Rappi e outras têm ganhado na Justiça brasileira a maior parte das demandas dos entregadores de aplicativos, que pedem o reconhecimento de vínculo empregatício. Segundo um levantamento do Data Lawyer, de 432 ações julgadas no ano passado, apenas cinco foram favoráveis aos entregadores.

A existência ou não de um vínculo de emprego entre as plataformas de economia compartilhada e os parceiros dos aplicativos é uma discussão sensível e atual. No último ano, havia 935 processos sobre o tema nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs).

Na visão de Alexandre Rosa, novo sócio do Goulart Penteado Advogados, esse tipo de serviço não possui o elemento da subordinação, essencial para o reconhecimento da relação de emprego. “Nesse sentido, a jurisprudência tem feito um contorcionismo hermenêutico para caracterizar como relação empregatícia uma situação fática que não encontra amparo legal”, diz.

De olho nas inovações e nos anseios dos clientes que buscam um atendimento personalizado e formatos de contratação mais atrativos e dinâmicos, o Goulart Penteado Advogados, inaugurou as atividades no setor trabalhista.

Com o desenvolvimento da área no escritório, e dentro do universo de constante evolução do mercado de trabalho e das novas tecnologias que crescem em progressão geométrica, o principal objetivo do sócio é trazer elementos concretos que possibilitem a tomada de decisões relevantes pelas empresas, por meio da ciência de dados.

“Particularmente, acredito que, em poucos anos, o contencioso trabalhista deixará de existir no formato que conhecemos”, disse Alexandre, em entrevista exclusiva.

Confira na íntegra o bate-papo que Alexandre Rosa, advogado com mais de 17 anos de experiência em direito do trabalho, teve com LexLatin.

Que tipo de trabalho é caracterizado como subordinação algorítmica? Qual é a diferença para outros tipos de subordinação, do ponto de vista do direito do trabalho?

Alexandre Rosa: A subordinação algorítmica é um conceito que diz respeito à suposta existência de subordinação jurídica entre as plataformas de economia compartilhada e os parceiros dos aplicativos, por meio dos algoritmos. Entretanto, a meu ver, em tais casos, não se verifica presente o elemento da subordinação jurídica, essencial para o reconhecimento da relação de emprego.

Trata-se de uma tentativa de ampliação do alcance do conceito de subordinação jurídica do empregado ao empregador, no intuito de se reconhecer a existência de relação de emprego.

Na mesma linha da subordinação algorítmica, houve a anterior criação do conceito de subordinação estrutural, o qual entende que o fato de o trabalho prestado estar inserido na estrutura necessária à atividade da empresa é suficiente para o reconhecimento do vínculo de emprego. Entretanto, a jurisprudência mais recente sobre o tema entende que a subordinação estrutural não seria suficiente para o reconhecimento do vínculo de emprego.

Assim, na minha opinião, a existência de subordinação estrutural ou de subordinação algorítmica não seria suficiente para a configuração de subordinação jurídica e, por consequência, não basta para o reconhecimento do vínculo de emprego.

Que critérios jurisprudenciais ou leis temos no Brasil em relação ao trabalho por meio de aplicativos? É reconhecido algum vínculo empregado-empregador?

Como mencionado, o entendimento jurisprudencial depende da interpretação sobre a existência de subordinação jurídica. Caso se entenda pela subordinação jurídica, configura-se a relação de emprego, a qual é regulada pela CLT. Contudo, no meu entendimento, não se verifica a subordinação jurídica e não há relação de emprego, tratando-se de trabalho autônomo regulado pelo Código Civil.

Quais desafios esta nova modalidade de “contratação” trabalhista traz?

A tecnologia traz novas relações fáticas que repercutem no campo jurídico, as quais devem ser interpretadas à luz do ordenamento vigente. Portanto, o maior desafio é a aplicação do direito aos novos formatos de contratação, evitando-se a insegurança jurídica decorrente da ampliação do conceito de subordinação.

Agora, por parte dos trabalhadores, como o Brasil resolve a questão da insegurança jurídica?

A segurança jurídica apenas existe quando não se altera um conceito, como o da subordinação jurídica, para se analisar novos fatos ou relações. Na minha visão, os prestadores de serviços que aderem às plataformas de economia compartilhada têm plena ciência do seu funcionamento, da forma de prestação de serviços – intermediada pelas plataformas – e, portanto, não há que se falar, a princípio, em insegurança jurídica.

Na sua avaliação, poderíamos falar sobre a falta de atualização da legislação em relação às novas tecnologias e principalmente a essa nova modalidade de trabalho?

Acredito que não. Entendo que o direito está sempre um passo atrás das relações sociais, sendo que a discussão sobre o tema pode levar a uma atualização futura da legislação. A diversidade de opiniões demonstra que ainda não há consenso ou maturidade sobre a questão, para uma alteração relevante no ordenamento jurídico.

Como você avalia essa dicotomia entre autonomia e precariedade do trabalho por subordinação algorítmica e qual você acha que é a melhor fórmula que deveria estar em discussão para cobrir as lacunas do novo paradigma trabalhista?

Não entendo que a prestação de serviços por meio de aplicativos seja, por si só, uma forma de precarização do trabalho. A questão deve ser analisada de acordo com a realidade de cada uma das plataformas disponíveis no mercado. Uma visão reducionista sobre o tema pode nos levar a abandonar o uso de tecnologias que geram renda e trabalho para uma parcela significativa da sociedade. A discussão sobre o tema é salutar e, certamente, trará uma visão mais profunda sobre as relações decorrentes das plataformas digitais.

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